Marlon Costa 🖤
É triste presenciar a morte de pessoas jovens, ainda mais quando se tem nosso sentimento e faz parte das nossas vidas. Queria poder dizer que eu poderia ter ajudado mais, me disposto mais, fazendo o correto para o bem da outra pessoa, mas às vezes eu sou duro, egoísta, e ciumento quando a atenção não é voltada a mim. Saber disso me faz me sentir mais compreendido, porque vejo agora o quanto eu poderia ter feito diferente, talvez a coisa poderia ter sido bem melhor.
Marllon Da Costa foi um garoto que conheci ainda menino, com 10 ou 11 anos, sobrinho da minha ex, e primeira pessoa a viver junto, Marcela Brasil, bairro Marco em Belém. Quando vim a primeira vez aqui, lembro dele alegre e brincalhão, parecia uma criança feliz, mas na verdade a vida, não só dele, mas familiar, era um pouco complicada. Mãe displicente, não possuía amor de pai, e quem o cuidava eram as tias Marcela e Márcia, e tinha como único companheiro seu irmão de quase mesma idade, José. Gostei dele, porém achava ser uma garoto muito solto, sem muitas redias, mas até aí não me interferia, era uma criança com sorriso estampado.
No ano de 2010 a 2011, um imprevisto fez com que nossos laços se tornassem mais fortes, por conta dele ter vindo morar comigo e a Marcela em Vigia, devido ter tido um desentendimento com sua mãe, mais precisamente ter levado uma "baita" surra, aparentemente sem motivos. No começo, e pelo fato de eu ser bastante espaçoso e não gostar muito de dividir atenção, não gostei da ideia, mas a Marcela provou que era muito importante ajudá-lo e dar atenção e carinho, pois precisaria, ainda sendo ela a responsável por ele, se sentia quase como uma mãe. Primeiros meses normais, apesar do meu modo sempre grosseiro e indiferente, me sentia na responsabilidade de fazer ele gostar de estudar, de ser alguém como eu. Chegou até a estudar comigo, porém eu fui rígido como costumava ser, e me irritava com ele, até que depois ele não quis mais saber, e eu deixei também de lado. Eu mesmo não sabia o que era compromisso.
A situação piorou quando as brigas começaram a acontecer com a Marcela e eu, e entre ela e ele. Nós dois por que sempre fomos dessa forma, nos estranhavamos, e entre eles tudo começou com um relacionamento, que ao meu ver era natural, porém nem tanto, de qualquer forma repreender só pioraria. Foi nas férias de Julho de 2012. Fretamos uma comb para Mosqueiro, e levamos alguns amigos, entre eles Penélope, Dani Faria, Drica, Álan e Paulina. Nesses dias de verão um caso me surpreendeu, quando vi o pequeno Marllon se beijando com a Penélope no quarto, deitados sobre o colchão inflável. Achei a princípio até romântico, pensei que fosse algo de férias, nada de mais, mas também um pouco preocupante, porque ele estava com 13 anos, e ela com 18, para mim normal, os outros que sempre são o problema. Era o caso da Marcela. Naquele mês ele não falou nada, apenas um simples comentario de que era ridículo. Mas tanto ela quanto eu não imaginavamos que os dois iriam se apegar tanto, eu até notei um sentimento, poderia ser uma paixão entre os dois, e fiquei mais admirado, pois nunca pensaria que aquele menino um dia podrria gostar de uma travesti. Mas surgiu, e eu deixei, até fazia comentários aos dois, inclusive pelo fato de eu também ter me relacionado com uma uns 20 anos mais velha, eu com meus 16 anos. Mas não sei porque a Marcela não quis aceitar, achei um pouco de hipocrisia suas criticas pelo fato dele ser de menor e ainda mais pelo relacionamento do tipo, colocando mil motivos, principalmente o fato de que poderia fazer uso da ocorrência para lhe prejudicar, visto que estava aos seus cuidados, e também mencionando que não queria isso para seu sobrinho, tipo, um relacionamento gay. Eu a disse muitas cpisas, a critiquei, tentei fazer com que ela relevasse, até porque sentia um amor verdadeiro, e mesmo que não fosse, seria uma experiência que as vezes é necessária, pois se a pessoa não provar suas curiosidades, ela não saberá o que quer ou quem é e do que realmente gosta. Sempre digo que não se pode mudar os gostos das pessoas, cada um sabe o que é bom pra sí. Ela o proibiu de vê-la e comecei a sentir a partir daí nele um ar triste, porém não revidava, era só um menino. De qualquer forma, os dois passaram a se encontrar escondidos, e nem eu sabia. Mas nada se esconde da Marcela; ela vasculha, e descobriu o que acontecia, pois ele dizia que todo dia iria encontrar uma menina com quem estava ficando, mas a verdade era com a Penélope. Num desses dias, quando ele voltava a tarde de bicicleta, ela o imprensou e o fez confessar a mentira, explodindo de raiva em seguida, dando tapas, socos e jogando sua cabeça na parede. Foi preciso eu e meu colega João Paulo (mais conhecido como Loiro), intervir para ela parasse. (isso foi um acontecimento ruim que ficou gravado em mim). Desse momento em diante percebi uma mudança gradual, mas violenta nele. Pequenos assaltos, usos de maconha, às vezes em público com o pessoal da baixada, e sentia ele mais distante. Eu nesse momento onde estava? Nem percibia o que estava acontecendo, ou mesmo nem ligava. Só pensava no meu status, no meu trabalho, na minha faculdade e no que ele poderia trazer de prejuízo, não pensei na pessoa que existia por dentro, mas é verdade que eu já gostava muito dele e me preocupava, apenas não sabia que o melhor era fazer ele se sentir bem comigo, não jogando coisas na cada dele. Eu sei que ele sempre me admirou, que eu fui um pequeno "pai" por um curto tempo, mas que pena que eu fui péssimo no que se referia a sentimentos.
Ontem e hoje está sendo o velório dele, morto a tiros na porta da sua casa, e muitas lembranças me vieram bruscamente, aquele sorriso, aquela alegria, e aquela carência que eu não notava. Estou dando a ajuda que posso, todos estão, sua mãe veio de Macapá as pressas, ele era um bom rapaz, melhor, era um ótimo menino, e sempre será.
Belém - Pá, 03 de março de 2016.
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