A falsa liberdade e o engano de si

Gritou o ego: Aqui estou eu, tão livre para ir, quanto para vir! Quem, pois, haveria de impedir que eu faça algo tal como quero? Quem pode ameaçar minhas escolhas ou quem pode prever o que farei? Sou livre e dono de mim!
Enquanto dizia estas coisas, a prudência o observava e levantando-se exclamou, dizendo: És um tolo! Como podes tu dizer tais coisas com tanta certeza? Acaso tu e a verdade fizeram as pazes? E como poderia ser isso?
Deixe-me fazer-te algumas perguntas? Pois, quero lhe dizes o que ouvi e o que tenho visto. E como bem me conheces, as farei com sensatez.
Ouvindo o ego tais palavras, respondeu em tom arrogante;
Ora essa, agora queres tu ensinar a mim?! Logo eu, que conheço tudo por livre e espontânea vontade? Dizei-me então o que queres, mas seja breve, afinal, não tenho tempo o bastante para você.
A prudência por sua vez, sorriu com boca de lobo e disse: Falarei sobre o que dizias e demonstrarei com minhas limitações, o que você talvez não tenha notado nesse teu pensamento. A começar por onde está! Visto que tu, habitas dentro do indivíduo e dele agora faz parte. Sendo assim, tu, ó ego! Julgas ser livre, porque está a conduzir o indivíduo que agora habitas. Contudo, se faz mentiroso. Pois tu mesmo é controlado pela vontade e pelo querer. A vontade disse para você dizer estas coisas e o querer sussurrou; vamos.. Tu também perguntou quem poderia lhe impedir que faças as coisas como se quer.. Ora, se o querer for teu e te aliares a ele de tal maneira que se vejam como um só, não o recebeu também de outrem? E quem seria esse outro que lhe deu o querer, senão a própria vontade? E que querer é esse? Do que se escolhe fazer? E se tu escolhe, o faz baseando na vontade. Vontade de quê? Se de poder, deves também levar consigo a possibilidade. Porém, se for vontade sem possibilidade, levas então a a tristeza ou a insatisfação. Disse também, quem pode ameaçar as suas escolhas e quem pode prever o que fará. Disto risse! Visto que tu, óh ego, só faz o que convém somente a ti mesmo. Isto não é previsível? E quem pode atrapalhar as suas escolhas, senão o medo, a circunstância, a tristeza e
a dor, os pesares entre outros. Embora, muitas vezes, tu tente se fazer amigo desses. E como se essas coisas não bastassem, disse ser livre e dono de si. Ora! És dono de si quando depende de todas essas coisas? E seria livre se não dependesse deles? Se é que podes.
Contudo, digamos que possas não mais depender de nenhum deles e ser tão somente de si. Ainda sim, não te irias deparar com a verdade?

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