Tudo que eu sempre quis, desde criança, era ter uma vida estável.
Tudo que eu sempre quis, desde criança, era ter uma vida estável.
Eu tenho quase todas as casas marcadas no bingo de um depressivo. Pai alcoólatra, abandono, vícios, histórico de abusos físicos e mentais... Escreve todos os clichês em pedaços de papel, joga pra cima e pega um. Já passei por ele.
Anos atrás, após muitos desses acontecimentos, eu disse pra mim mesmo que não viveria até os 20.
Me machuquei de inúmeras formas, tentei partir dessa pra pior, mas nunca tive sucesso.
Fui uma pessoa ruim tanto pra mim mesmo quanto para as pessoas ao meu redor. Falei coisas horríveis e fiz coisas horríveis.
No primeiro ano do ensino médio conheci uma garota e decidi deixar meu medo e vergonha de lado. Sentei do lado dela e o papo desenvolveu como nunca antes. Passávamos a aula toda se comunicando através de notas as quais arremessávamos um pra o outro quando o professor se virava. Nós compartilhávamos muitas dores. Confiei nela, mas por conta de também estar passando por um momento ruim, ela me machucou de uma forma que só fui perceber anos depois.
Me senti culpado, envergonhado... Um lixo.
O assédio sexual quase nunca é tratado de forma séria na cultura pop quando se trata de homens. Isso não é aquele papo de "Ah, mas homem também sofre" que você escuta dos tão famosos "Red Pills" em um podcast qualquer. (Aliás, fico triste por terem adotado esse termo. Matrix é um excelente filme e esses caras não prestaram atenção na mensagem.) Até porque todo sofrimento em minha vida é pouco. Eu aguento.
Eu também não fui uma pessoa boa na vida dela, mas nunca a machuquei dessa forma.
Um tempo depois conheci uma outra garota através de um velho amigo de infância.
Bonita, engraçada e novamente... Tão quebrada quanto eu. Tentamos ficar algumas vezes, mas mesmo bêbados, nunca rolou.
Nós desenvolvemos um amor diferente um pelo outro. Uma coisa quase familiar.
Uma vez ela me disse que eu passava mais segurança do que o seu próprio pai. Admito que também me senti como uma figura paterna muitas vezes.
Inclusive, adoraria ser pai um dia. Mas não sei se com uma mente tão quebrada eu conseguiria ser um bom pai.
Enfim... Viramos melhores amigos e hoje a chamo de irmã. Mas sinto que depois de um certo momento nem eu consigo ser bom pra ela, nem ela consegue ser boa pra mim. Tenho medo de perde-la por conta de tudo que já passamos juntos, Mas sinto que é inevitável.
Inclusive, chegamos ao ponto de fazer um pacto suicida em uma noite particularmente ruim. No dia que ela se fosse, eu iria. No dia que eu fosse, ela iria.
Anos depois, chegando aos 20 anos que nunca achei que iria chegar, entrei em uma universidade e conheci a garota mais incrível que vi na vida. Absolutamente linda de corpo e alma. A mente mais brilhante que encontrei pessoalmente.
Escritora, professora, enfermeira e uma excelente amiga.
Novamente, temos muitas dores em comum. Eu me vejo nela, e sinto o dever de protege-la de todas as formas possíveis.
A família dela foi a primeira família a me receber bem em suas casas. Me convidaram pra beber, pra almoçar e até pra viajar com eles.
Já fui chamado de muitas coisas ruins no passado. Ladrão, psicopata, sociopata, capeta, anti cristo e até mesmo de estuprador. Sendo esse ultimo cortesia da mãe da minha ex, a qual eu nunca nem ao menos tive alguma relação sexual no tempo que estivemos juntos.
A garota a qual me refiro, vulgo a enfermeira/professora/escritora de mente brilhante me ajudou mais do que eu poderia colocar em palavras nos últimos meses. Pela primeira vez na vida eu fui de fato honesto sobre quem sou. Sem medo de mostrar meu lado bom ou ruim. Já cheguei à, deitados olhando as estrelas, contar sobre o que aquela primeira garota fez comigo no passado. Falar sobre todas as minhas tendencias, medos e aspirações... Ela, por sua vez, também confia em mim e me contou coisas tão profundas e pessoais que até hoje eu me pergunto se sou digno de tal confiança.
Nossa relação é muitas vezes estranha/confusa e sinto por ela um sentimento que nunca senti por alguém.
Na verdade, depois de conhece-la, a maior parte dos meus sentimentos são novos. Tanto os bons quanto os ruins. Eu nunca os senti com tanta intensidade.
É como se eu fosse uma criança novamente, aprendendo sobre o mundo. Redescobri inúmeros prazeres e medos.
Pela primeira vez desde o fatídico acontecimento no ensino médio, o toque não é mais doloroso para mim.
Ela respeita meus limites em todos os sentidos.
A maior parte de vocês, depressivos assim como eu, não gostam de ouvir sobre isso. Mas depois de conhecer ela eu consegui, pela primeira vez na vida, me conectar com o que sinto que seja Deus.
O sentimento que sinto agora, pensando nela e escrevendo isso, é quase inexplicável. Acredito que talvez isso seja um pouco de Deus dentro de mim.
Apesar de tantas coisas boas, inclusive finalmente ter conquistado o emprego dos meus sonhos (sim, aos 20 anos de idade), eu ainda tenho pensamentos horríveis.
As vezes me sinto completamente esgotado. Mas deitar com ela em meus braços enquanto olhamos as estrelas, ou dirigir por ai gritando letras do Jão e do Cazuza para o mundo todo escutar... Me enche de determinação.
Sinceramente, não sei como terminar essa entrada. Acredito que no fundo eu só queria escrever um pouco sobre como me sinto sobre algumas coisas e saber que alguém vai me escutar.
Eu estou, aos poucos, reaprendendo a ter amor pela vida e pelas pessoas. Por mais que ainda tenha um longo caminho pela frente.
Não posso te dizer como a história com a enfermeira e com a amiga vai terminar. Até porque, nem eu mesmo sei onde isso vai dar. Infelizmente minha mente me diz que vai ser catastrófico para mim, mas tento me convencer de que isso é somente a minha ansiedade e os meus traumas falando.
Já destruí muitas coisas por conta deles e não quero cometer o mesmo erro novamente.
Obrigado por ter lido até aqui...
-R.F.
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