Anatomia do colapso
Chegou.
A data que habitou meus sonhos como profecia ambígua: "o dia em que tudo acabaria".
Mas o fim, descobri, não é um estrondo. É uma silenciosa corrosão.
As mesmas figuras do sonho agora dançam na realidade, executando coreografias que meu subconsciente anteviu em pinceladas surreais. Coincidência? Sincronicidade? Ou meu cérebro apenas decifrando padrões que os olhos diurnos se recusam a enxergar?
Perguntas sem respostas são como labirintos sem saída - fascinantes e cruéis.
Eis minha maldição (ou dom): ver o invisível.
Descortinar falsidades nas entrelinhas de um sorriso, nas pausas calculadas de uma frase, no tremor involuntário de um dedo sobre a mesa. Enquanto outros navegam na superfície, eu mergulho nas profundezas turvas das intenções não ditas. Chamam isso de "paranoia". Eu chamo de sobrevivência.
Mas há um preço por enxergar demais:
Cada nuance decifrada é um tijolo a mais no muro entre eu e o mundo.
Cada detalhe percebido, uma faca que corta a ilusão do "talvez eu esteja errada".
A máxima permanece: ninguém acredita na falsidade alheia até que a máscara caia - e só vê quem quer enxergar. Eu, porém, aprendi a ler o teatro humano como quem decifra hieróglifos: o roteiro está nas sombras, não no palco iluminado.
Hoje, enquanto observo que "começou a acabar", questiono:
Será que o sonho foi premonição ou criação?
Um aviso do universo ou um espelho de medos que carrego desde aquela criança de 9 anos, que aprendeu cedo demais que até os laços de sangue podem ser cordas de forca?
O fim é só outro nome para recomeço.
Ou talvez seja só mais um capítulo do mesmo livro, escrito em loop infinito.
A única certeza? Continuarei observando.
Até que o último véu caia.
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